domingo, 30 de abril de 2017

complicamos só por diversão

a vida aqui segue boa e calma
como uma cidade pequena em que
o céu fica rosa no fim da tarde.
o meu peito se fechou
se costurou e remendou
a tal ponto que ri da dor e
do amor.
sabe que as manhãs podem ser tão boêmias
quanto às noites de sábado num bar.
se eu acordo, me reviro,
me lembro que sonhei com você,
sinto todas as partes do meu ser que foram
esquecidas.
o que veio antes de você,
eu realmente o amei.
ainda era um amor da forma que conheço,
real e naturalista,
kafkiano. assim como eu.
e depois isso foi embora tão abruptamente
que sinto a neve.
ou melhor,
não sinto nada, de tão adormecida.
nada da cintura da cima, pra ser mais precisa.
a dor não existia no último sábado a noite,
mas hoje é outro dia.
o peito me aperta, eu sinto alguma coisa.
dessas coisas que ouvimos falar,
que os mortais e os idiotas sentem,
que eu e você ríamos quando nos conhecemos,
quando contamos um ao outro
que já não temos coração.
e eu não sinto isso por mais ninguém.
sou ainda fria e morta de amores triviais.
eu não sinto dor, porque isso é pros fracos.
você me deixa fraca, aos teus pés...
isso significa que eu gosto mesmo de você.
mas isso também significa que
eu não preciso ter você.
na realidade, você não fez o suficiente pra me merecer.
não sei como ficamos, então.
ficamos, nos beijamos e nos amamos
como deve ser.
e a única diferença entre você e eles
é que por você
eu teria dito sim.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Prosódia

Incrível como eu me apaixonei de cara pela sua voz. E não foi só isso, claro, mas todo esse seu coração altruísta que quer mudar o mundo com toda a calma e tranquilidade. Antes eu achava que você falava assim comigo porque estivesse sem vontade de falar, ou sono, ou outra coisa. Agora já me acostumei e vivo elaborando meios de te dizer que eu adoraria estudá-la num projeto da faculdade. É que a sua voz é toda assim. Com esse timbre e essa prosódia que me deixa fora do ar. Uma voz-inspiração. Esse seu sotaque que acompanha umas palavras que não estou acostumada a ouvir por aqui. E também, toda uma cadência marota que denuncia de onde você vem. Já que você demora tanto; já que quando vem, não quer ficar; já que vai embora com a mesma pressa-tranquila-praieira-hétero-cis-paulistana que veio. Me diz, loirinho, tem mais assim lá de onde cê vem? Me traz um da próxima vez! Mas que tenha essa sua voz...

terça-feira, 25 de abril de 2017

Combustão

Escrevo a fim de materializar. Não sei, parece que os outros o descrevem melhor do que eu, que agora pouco ainda sentia o cheiro dele. E se me perguntam se estou apaixonada, se me alertam da encrenca na qual eu me meti, já não sei explicar muita coisa. Eu leio, ele se materializa. Eu pisco, ele já se foi, deixando só a fumaça no meu cabelo. Dia desses, cheguei mais perto e verifiquei se era mesmo real, pois podia ser tudo alucinação, uma história daquelas que ouve um velhinho contar no elevador. E então, cá estou com a mesma dúvida. Ele é real? É de verdade? Seria tudo uma construção da minha mente pra culminar numa só pessoa aquilo que me é mais excitante e mais desafiador? Uma dualidade que te alinha pra depois te desmontar. Um teste pra minha paciência e auto controle. Ai, ai...
Te anunciaria por aí às mulheres solteiras de meia idade e ganharia milhões.
Pena que o isqueiro está comigo. 
E aí, a combustão. 

sábado, 22 de abril de 2017

Nua

É, sou corajosa. Dentre tantos motivos, também sou corajosa por ser uma escritora que usa as próprias experiências de vida como matéria prima. Admiro muito os ficcionistas, também gosto dos meus textos ficcionais, mas reconheço que é preciso um bom tanto de coragem para falar de si, para falar dos seus sentimentos, para falar de quem se ama, vez ou outra, até escrever dedicatórias. 
Não pensem que é só escrever e pronto. Muitas vezes, ficar nua frente ao texto e ao público, se lembrar de que arte é arte e do juramento que fiz de nunca podar a minha arte, mesmo sabendo que o carinha mencionado vai ler ou que o carinha não mencionado virá me fazer perguntas. 
Eu sempre me cubro tanto de metáforas e essas técnicas que a gente aprende lendo o texto dos outros, que hoje eu resolvi vir aqui nua mesmo, usando apenas meus brincos de hematita. 
Vim aqui dizer pra essa tela em branco do meu computador e também dizer pra mim mesma que está difícil se abrir pros outros e encontrar algum tipo de apoio nas minhas empreitadas malucas. As pessoas têm medo por mim e vivem me dando conselhos... Conselhos... Acho que ainda devo ter cara de ingênua, sei lá. 
Estava me olhando no espelho agora pouco, sem maquiagem. Me sinto diferente, confiante e leve. Olho pra imagem e enxergo meus olhos puxados de índia, minha pele dourada e juro pra mim mesma nunca clarear o cabelo, pois fico bem assim. Nesses últimos feriados eu engordei um pouquinho e fica bem perceptível quando começa a aparecer uma covinha na minha bochecha. Estou feliz. Estou satisfeita como nunca estive antes. Eu me acho bonita, não tenho mais vergonha do meu corpo frente aos outros, sou autêntica quanto ao meu estilo, descobri um poder fora do comum quando uso meu olhar (principalmente quando sei que a outra pessoa não é tão segura quanto eu), mas eu também adoro o fato de virar uma pamonha medrosa quando estou apaixonada. Faz parte. E isso é bom. 
Ainda frente ao espelho, enxergo o meu pai. Apesar do meu momento poeta não ter sido influenciado por ele, estou toda orgulhosa por termos isso em comum. Meu pai é poeta, um poeta dos bons, tão bom que conquistou a garota mais difícil da fábrica com suas cartas de amor. Eu nasci no meio dos versos, isso não é demais? 
Minha mãe, a moça séria, a mais bonita, a mais reservada e a mais difícil. Metade da minha personalidade e esse nosso corpinho de Barbie que não engorda nunca. 
Eu me enxergo tudo isso e mais um monte de coisa. Mas ingênua não. Eu sou forte, corajosa. Posso estar um pouco perdida quanto ao que eu quero, mas eu sei exatamente o que eu não quero e isso mantém meus dois lindos pés bem fixos aos chão. 
É sábado. Eu não quero ninguém ocupando os meus sábados. E isso não é fruto de nenhum sentimento ruim, muito pelo contrário. Só quero uma folga, quero não ter que me preocupar com o resfriado de ninguém, só com o meu.
E nesse tempo sozinha eu conheci pessoas incríveis, algumas delas, já vou avisando, ninguém vai tirar de mim. Eu me apaixonei e desapaixonei algumas vezes, confesso. Mas algo mudou nessa minha maneira de me apaixonar e me entregar ao longo dos anos, por exemplo, eu daria todos os "não" que fossem preciso pros caras legais em que eu estivesse só apaixonadinha. Eu já namorei alguns caras legais. Os caras legais são ótimos, mas eles não chegaram às camadas mais profundas do meu coração. Eu estou fugindo da superficialidade, Deus, como eu estou fugindo e isso é extremamente difícil. Há coisas que eu sinto e eu nem chamaria de amor, é outra coisa, e que me faz virar do avesso. Eu sinto! Eu sinto por pouquíssimas pessoas! Eu sinto apesar do bem e do mal, do moral e do imoral. E eu não namoraria por menos. Eu não namoraria só porque o cara é legal.
Bem, só queria eternizar mais um dos meus momentos de inspiração frente ao espelho, numa troca sincera de amizade e empatia comigo mesma. Eu estou linda. Eu não preciso mudar nada, nem comprar nada e sou grata por tudo. Grata principalmente a minha escrita, sempre aqui quando eu preciso, a arte pela arte, com o propósito de transcender, sem julgar, sem conselhos triviais, só por repetir aquilo que se ouve do senso comum... "Essa não é uma boa hora pra você se apaixonar"... "Esquece ele logo!"... "Toma cuidado com essa história toda"... 
Bobagem.
Bobagem. 
Eu sinto tudo. Eu sou minha própria guia. Eu confio eu mim. 
É, sou corajosa.

domingo, 16 de abril de 2017

Talvez sejamos feitos da mesma substância química

Não terá de mim um acordo por escrito,
Um poema claro o suficiente com seu nome
Bordado na minha camiseta rosa bebê.
Porque minha liberdade e libertinagem são irmãs gêmeas separadas,
Uma no meu coração,
Outra nas solas dos meus pés.
É preciso percorrer todo o resto.
Por mais que você seja um leitor experiente
De Guerra e Paz
E das dores e prazeres do mundo,
Você quase sempre me decodifica
A não ser pela parte minha (e sua)
Que só eu consigo ver.
E que você, por sua vez, não acredita.
Você me aflora, me floresce, me dá uma certa coragem pra burlar as regras.
E estar ao seu lado é como encontrar uma certa extensão,
Uma continuação de mim.
Eu rodeio, tateio, uso todos os meus seis sentidos e vou a fundo em você.
Me esqueço das beiradas, das suas margens
E dos objetos pontiagudos que você enterrou na areia,
Depois cobriu com cimento.
Estamos lá, tentando nadar um no outro,
Vivendo essa experiência louca que eu chamo de
Você e eu.
Eu e você.
Moi et toi.
Seja meus altos e baixos!
Seja minha má influência!
Seja em mim
Até quando for.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

As mãos

Nas minhas mãos não encontro beleza,
Perversão ou prazer tamanhos
Quanto no íntimo dos teus olhos.
Elas sim me satisfazem pois me compram quinquilharias reluzentes,
A arte, os poemas que me seduzem.
Me afagam os cabelos,
Essas suaves mãos,
Me permitem a sina de escrever o verbete ideal
Que arranca um gemido ou outro
Dessa sua boca
Austeramente desenhada.
Seus toques de seda,
Premeditados,
Voltam-se contra mim quando sob a minha roupa.
Já não quero mais as minhas mãos
No 505 ou num corredor apertado de biblioteca,
Entre uma estante ou outra,
Entre Kafka e Álvaro de Campos,
Meia luz, a segunda taça de Merlot,
A distância entre a sexta feira e o final de domingo
Que é quando eu fico mais aflita.
Não as quero,
Por ora,
As rechaço.
Meu corpo todo quer um arranhar de barbas
Por entre os meus joelhos
E as tuas, as tuas mãos!
Procuram, apertam, arranham, se demoram
E deixam na pele o toque, mesmo depois de cessar.
Fortes, quentes, loucas, inconsequentes, fundas, profundas.
Mãos que não sejam as minhas próprias,
Ao final de um domingo,
Buscando lá no fundo da alma
Algum toque
Teu.

quinta-feira, 13 de abril de 2017

breezeblocks

Marquei de fazermos amor hoje à noite, assim que chegasse em casa, ao som de Alt-J e suar, suar, até que a levantássemos a temperatura da cidade toda. Estou aqui na minha cama, sozinha, lutando contra o sono e pensando que eu dormiria na primeira música, antes que você terminasse de tirar meu sutiã. Tudo bem, querido, deixemos pra amanhã, feriado, no almoço em família em que eles discutirão a violência no país. Enquanto isso eu beijo aquele caminho de perdição entre seu umbigo e seu... 

Na minha mente, eu e você, o tempo todo, o tempo todo... 

Aproveite os minutos antes de beijá-la

É tudo questão de um mero capricho. Os vestidos, por exemplo, a seduziram com suas curvas bem ajustadas e pernas de boa moça, que frequenta a igreja aos domingos pela manhã. Tão sérios os três que ficariam lindos jogados no tapete do quarto dele, do lado da cama, um em cada dia da semana, às terças, quartas e quintas. Conheço algumas que enfeitariam esses vestidos comportados e você também irá se lembrar de uma ou outra que conheceu na adolescência. Quando pensar nisso dentro de um elevador, ver no espelho suas olheiras de noites mal dormidas tentando entender essas garotas de bar que parecem não ligar pra vida de ninguém, lembre-se apenas de como dançam nesses vestidos comportados, fazendo com que tudo pareça ter vindo direto do inferno, queimando no seu colo. É um mero capricho dos deuses pra florear os dias comuns. No fundo, se conseguir levá-la pra casa, verá como seus cabelos acordam bagunçados de manhã e que não saberia lidar com essa leoa na segunda feira às 18 horas após um trecho de trânsito na cidade. Imaginar tê-lo de todas as maneiras possíveis - e impossíveis -, depois se perguntar se isso está mesmo acontecendo; implorar pra que a resposta seja não, fazer amor e fazer amor de novo. Ter a realidade ao alcance dos dedos, continuar desejando a ilusão. Preste muita atenção quando ela dançar em cima da sua cama, nua ou só de calcinha e camiseta, fotografe esse momento na memória e não deixe ela saber que gosta muito disso, a não ser pelo desejo no seu olhar. É apenas um capricho. Não pode ser banalizado. Não pode deixar de ser um capricho. Ou então, perde toda a graça. 

segunda-feira, 10 de abril de 2017

Mais um poeminha pra quem não me merece

Ando escrevendo tanto e sentindo tão pouco.
Desde aquele beijo e do seu ponto final,
ou vírgula,
colocadas na oração errada,
que não me sinto mais parte de um nó.
Talvez a dor movimente um pouco a vida
de quem é sempre feliz consigo mesmo.
Me parece sádico, mas quem garante que não é?
Me prometeram mordidas e cenas quentes
e que o doi em mim é só a ausência entre um encontro e outro.
Se bem que, nem doi tanto e eu sinto falta da dor.
Gostava de não dormir e não estudar pras provas
por estar falando contigo dias inteiros.
A vida dos príncipes encantados é absurdamente pacata.
Você dormiria só de olhar como eles seguram a minha mão.
Bem, você me acendia só com uma mensagem falando sobre uma consulta médica.
Não há roteiro pra isso.
Você nasceu foi prar acabar com a minha vida!
Então, por favor, vê se faz logo às honras!

Extravagância

Ando planejando estratégias pra aperfeiçoar meu plano de fuga. 
Mostrei olhares por aí e não imaginava o quão perigoso seria
deixar que eles me olhassem por mais de dez segundos. 
Confundi minha definição de experiência com o erro tolo
de separá-la da intensidade. 
Eu sou e sempre fui uma mulher solitária 
e então chega essa gente me ensinando
duzentas e sete maneiras de aproveitar a vida
no meio da multidão. 
A vida veio disfarçada com uma fachada bonita
de prazeres terrenos e meramente visuais.
E eu me rendi,
esquecendo que na verdade nem desse mundo eu sou.
Hoje me puxei pela mão,
me guiei num passeio íntimo,
deitei sob a lua e deixei que ela limpasse minha aura. 
Eu não suportaria mais um único beijo que não me fizesse 
transpirar,
ofegar, 
inundar. 
Nunhuma energia outra que provocasse pouca incandescência. 
Eu nasci brasa e frenesi, 
não sei estar perto sem querer estar. 

Ando planejando estratégias pra aperfeiçoar meu plano de fuga. 
Preciso da minha doce solidão pra que eu possa me dedicar
(e me deliciar)
a uma obsessão de cada vez. 

E não há nada que os outros possam fazer... 




domingo, 9 de abril de 2017

Solto, você vem...

Há algo sobre eu e você, uma coisa além do que meu entendimento alcança e metafísico demais pra se ver a olho nu. Dessas coisas que não se pode explicar e que os escritores, poetas, artístas e cineastas tentam a todo custo capturar e fazer com que as outras pessoas sintam. Eu senti isso agora, uma faísca, um décimo de segundo noutro plano em que eu e você pudemos nos materializar. Nos materializar como tal, eu e você, dividindo a cama, o cobertor, o mesmo copo, eu usando a sua camiseta num domingo a tarde e você sendo aquele cara que me leva pra conhecer a mãe e conquista a confiança do meu pai. Eu e você como a coisa mais maluca e improvável, pois amanhã logo que eu acordar, vou pegar minhas coisas, amontoar na mochila e sair por aí resolvendo a minha vida, feliz por estar sozinha. Esse eu e você já ultrapassou os meus limites de autossuficiencia, por um instante eu só queria que você me chamasse de "minha" e abaixasse a sua guarda pra que eu pudesse fazer você feliz. Você é também um dos meus maiores medos, e olhe lá, eu nunca sinto medo. Você casualmente fazia falta, mas já nem faz mais. Eu não gosto de ser a mulher que você me deixa ser, porque eu sou tão maior que isso que você me dá espaço pra mostrar. Mas esse texto aconteceu, em um momento em que fechei os olhos e então eu e você foi tudo o que senti em meu coração. Olha que ele não se engana... Se uma estrela passar aqui nesse momento, se os deuses se reunirem e decidirem por nós dois, querido... 
Eu te faria feliz e você me apresentaria o tal do amor que eu ainda não conheci. 

Esse garoto está sempre ali na escada, fumando um cigarro e arrumando o cabelo

Entendo quando me perguntam porque ainda não o beijei. De fato, ele é muito bonito e nem eu mesma sei dizer o quão forte, ou boba, estou sendo perante essa situação. Ele encontra o ponto culminante de todo o meu desejo dissolvido e repartido entre os dias, os olhares, os beijos na bochecha, bem perto dos lábios. Daqueles que você usa pouco com medo de gastar; sente o cheiro antes de morder.
Realmente, ele é muito bonito. Não uma beleza dada e escancarada, mas uma explosão nuclear de sensações que ele me desperta quando sorri de ladinho ou mexe no cabelo. Costumo dizer que também precisa ser uma alma bonita pra conseguir admirá-lo por completo.
E dentre todos os meus planos, textos, poemas, meus prazeres solitários, melodias excêntricas, rimas sujas, homens de meia idade ou qualquer outra maneira de retomar as rédeas da minha vida, não fui capaz de substituir a sensação que é ser fitada por ele.
Esse garoto está sempre ali na escada, fumando um cigarro e arrumando o cabelo de um jeito que você não encontrará em qualquer esquina. Fica ainda mais bonito quando fala e ele é capaz de fazer com que você esqueça tudo o que já aprendeu até chegar ali.
Ele vai te trazer pra bem perto e fazer com que você se queime com o calor do corpo dele. Vai te tratar bem, elogiar você como John Keats elogia Fanny. Não há como ficar muito a vontade. Ou há, se você sentir vontade de levá-lo pra outro lugar. Isso sempre me ocorre.
Não pude encontrá-lo, olhar pra ele e deixá-lo ali da mesma forma que o encontrei. Você também não seria mais a mesma e não tem como reparar todo esse desastre.

A vida está muito boa. Até ele aparecer. Me desestruturar. Eu não sei lidar com tudo isso.

sexta-feira, 7 de abril de 2017

Você tem todos os beijos que eu ando economizando por aí

Não há como te defender.
Nem pra mim mesma, nem para os outros,
apenas busco desculpas ou mentiras
pra justificar o meu desejo.
Digo que você tem lábios macios,
embora eles não tenham percorrido o caminho que você traçou.
De fato, seus lábios macios não fizeram nada além
de falar frases soltas com essa sua voz maldita de gostosa
e acabar com o que sobrou de mim.
Você se fez presença independente das 60 canções que nos separam.
Você entrou pelo machucado que havia em mim
e agora você ainda corre em minhas veias,
sem eu saber explicar por que.
Isso não havia de ser nada demais,
visto que sou eu. E nós dois sabemos bem disso.
Mas havia de ser você, ou sua ausência,
pra me fazer morder os lábios
e pedir, gemer por mais.
Você nem aguenta me olhar nos olhos.
Você tem medo de quê?
Do meu quadril em você
ou do meu coração em você?
Tolo! Tola!
Não encontro explicações pra justificar
que você tem de mim
tudo aquilo que você quiser.
Mas resta saber,
você quer?

auê

Sou teimosa. Pacífica, mas teimosa. Nunca dei muita bola pro que os outros falavam sobre eu sei fria e insensível, mas algo de estranho me faz pensar que todo aquele papo furado é a mais pura verdade. Bom, não mais. Por exemplo, percebo o quanto essas pequenas paixonites do dia a dia me fazem escrever muito melhor do que o tal do "grande amor da minha vida". Talvez eu já devesse desistir de basear esse termo nos romances do Flaubert, pois mimimi demais não me deixa comovida, mas enojada. Sim, sou teimosa. Sou do contra. Jamais beberia veneno por alguém, pois desde que nasci sempre fui o amor da minha vida. Então isso é o que? O que é o inverso de alma gêmea? O que é que essa bagunça toda faz em mim pra eu poder escrever bem melhor que antes, o que um "amor da minha vida" tem que fazer pra que, no final do namoro, eu sofra ao menos um pouquinho? Não sei. Estou descobrindo. Sou teimosa e continuo ouvindo Mardy Bum repetidas vezes a tarde toda. Talvez eu tenha nascido pra ser só minha.

Pra onde está me levando?

Você passaria uma noite toda comigo, deitado ao meu lado debaixo dos planetas, observando as luzes da cidade que brilham pra mim, me ouvindo contar sobre minhas teorias, sobre a vida e o passado que tentou me ferir, sem sucesso. Tentaria entender que meu deboche pela dor vem do fato de que também rio da cara do amor verdadeiro, a alma gêmea. Em todas as frases que eu disser, você completaria a última palavra e saberia todas as referências literárias que saíssem da minha boca. Eu ficaria perplexa com todos os assuntos e por um mundo enorme caber dentro de uma pessoa só. Você me contaria casos de amor, verdadeiros ou não, mas seriam boas histórias. Eu mentiria dizendo que não fico excitada quando você coloca seus óculos de grau e você me provocaria pra saber até onde vou nessa história toda. Eu escreveria mais um pouco ali pra você, terminaria a noite exausta de tanta novidade acontecendo na minha vida, implorando pra que você acabe com ela. Eu usaria menos metáforas, o quanto fosse possível. O menos de roupa quanto fosse possível ali naquele lugar escuro, debaixo dos planetas, observando as luzes da cidade que brilham pra mim. Não sei onde mais procurar por tudo isso, porque há apenas um lugar onde eu gostaria de estar. Nem sei se esse lugar existe mesmo, ou se é em algum canto dentro de mim que ninguém jamais esteve. Eu escrevo pra me esvaziar de tanto lirismo, que atrapalha a minha vida por achar que dessa vez não vou debochar de nada. Você me faz achar que não. Eu escrevo, escrevo, isso não é o suficiente. Você acaba com a minha sanidade e eu ainda peço por mais. 

A rosa e a peônia

São elas, as duas mulheres inquietas, boêmias, no canto do bar escrevendo baladas em guardanapos. Seus olhos intensos e profundos, um abismo dentro de si. Olhos castanhos, essas duas mulheres. Gostam de flores, mas uma fica com peônias e a outra com rosas vermelhas. Um mero detalhe que o fez se apaixonar, por uma e por outra, sem saber de tanta e tanta coisa que havia nessas mulheres. Pele clara, uma e outra, cabelos castanhos, avelã ou chocolate, eu já não saberia dizer, embora ele soubesse diferenciar a textura de cada uma delas, de olhos fechados. Essas cinturas, dessas mulheres, qual o estilo que cada uma se identifica mais, mesmo com uma biblioteca em comum. Elas sorriem igual. A língua que elas falam é a mesma. Ah, por favor, não me diga que não notou que elas poderiam ser uma só. As mulheres dele, mesmo sendo delas mesmas. Havia tanto para se agarrar nelas, então o que foi que acontecera ali? Ouviu-se falar do mesmo homem, aqui e ali, pelas duas bocas que coincidentemente usam o mesmo batom. Elas o descrevem nas linhas uma da outra, talvez o amassem eu outra ocasião ou contexto, talvez cada uma delas pudessem procurar onde lhes foi que nelas doeu mais. Onde foi que ele segurou mais. Repartiriam os poemas ao meio, compartilhariam, os três, uma taça de vinho, ora, ora... As duas são feitas de vinho. Elas são uma só, ele não notou. Então elas se deliciam com isso. Elas o comem e lambem seus ossos no final. Escrevem palavras de amor. Brindam juntas no final. 

72 horas

Eles fincam seus olhos em mim, nos meus laços de cabelo, lábios de cereja e cara de mimada. Seguram minha mão de leve como se fosse pra não me quebrar, tocando meu rosto de porcelada com cuidado, dizendo duas ou três frases clichês sobre como eu ficaria bonita num almoço de domingo. Eles se assustam quando descobrem a minha liberdade e a capacidade que tenho em dizer mais não do que sim. Porque sou mimada e egoísta, eles dizem, porque nada é bom o suficiente, nem a dor que podem me causar. O que ocorre é que esse percurso todo eu já conheço, eles, muitos deles, ainda não. Ora, não sentirei nada além de uma carícia se algum desses homens tolos, de repente, forem embora. Levarei 72 horas, não mais que isso. É sempre no terceiro dia em que recolho do chão um brinco ou outro que deixei cair. A liberdade é um espaço grande demais, pois é preciso um sentimento grande demais. Os jovens amadores, os velhos amadores, os intelectuais de direita, os medrosos e os vendedores de flores, eles nunca entenderiam. É preciso ter uma liberdade do tamanho dessa pra poder enxergá-la dentro dos meus olhos. Poucos olhos os que me fazem ser mais livre e inconsequente. Me impulsionam. As palmas das mãos dos intelectuais de direita são macias demais e puras demais. Ei, eu não sou frágil. Eu inclusive já tinha me esquecido do gosto do medo. Me venham com dores banais e beijos banais, flores banais e já terei vivenciado tudo isso. As palmas das mãos, nelas deve haver um paraíso proibido, dor demais, daquelas que nunca senti. Eles, que não entendem dessa liberdade, eles nunca irão me prender. 72 horas. É o tempo que eles têm. Quem sobrevive depois disso? Não sei, eu nunca estive do lado de lá. Da dor, do prazer, além de onde minha vista alcança, dos meus limites. Se não for me levar pra lá, me poupe do trabalho de te dizer "não". 

terça-feira, 4 de abril de 2017

Você e todos esses jeitos de me beijar que eu ainda não conhecia

O relógio avisa, 
É madrugada! 
Vem você, sempre intenso
Despeja em mim seus elogios
Põe teus versos pra me entregar teus beijos
E me acende ainda mais.
Noutro dia, 
Quando apontam os raios de sol,
Coincidentemente 
Eu acordo mais bonita. 

segunda-feira, 3 de abril de 2017

Bruxa

Vem! Faça um círculo de sal grosso ou alho ao meu redor, me proteja dos morcegos que querem fincar seus dentes em meu pescoço. Me livre dos sapos, dos meus cabelos soltos e ondulados, das minhas vestes pretas que lhe causam sensações. Vem! Pra me cobrir ainda mais, pra me encher de panos de seda, palavras doces, antídotos aos montes. Me proteja do mundo, dos homens, da maldade. Me alimente pra me engordar e me proteja de quem me quiser em cima da mesa, num banquete. Sou frágil? Uma princesa? Você pensa que sim?
Tente me queimar na fogueira que acendeu ao meu redor: descubra que eu tenho asas. Eu os alimento com meus poemas pra depois me deliciar. Seus alhos e sal, tempero sua salada com poucas calorias. Eu fico com o que há de mais errado. Vem! Vem só pra sentir eu escorregar por entre seus dedos e me juntar aos morcegos em cima das árvores. Não tente me salvar: eu organizo meu próprio resgate. Sou a bruxa, não percebe? Tenho uma série de cabeças expostas, tenho radar pros teus galanteios, um caminho de flores até a entrada da sua gaiola.
Vem! E me observe fugir.