terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Quero adotar um gato

Em mais uma das minhas enquetes hipotéticas (adoro essa palavra) perguntei aos meus amigos se eles se lembravam do nome do macaquinho do Ross (que só aparece na primeira temporada). A conclusão que cheguei foi de que ninguém se lembrava, uma coisa que passa despercebida, mas que é de tamanha importância, tanto que o macaco foi colocado ao lado do dono no seu Funko Pop. Bem, também temos a enquete do porta malas. Por incrível que pareça, sou a única pessoa que não consegue abrir o porta malas do próprio carro.
A questão aqui não é o nome do macaquinho do Ross (ah, se estiver curioso, procure no Google) que me fazia rir, porque é o mesmo nome de um futuro-pseudo-hipotético crush. ~ Imaginem qual não era a minha crise de riso quando dizia a voz do cara em voz alta nas conversas com as minhas amigas ~. A questão aqui é que Ross, já na segunda temporada, queria adotar um gato com Julie, sua namoradinha enjoativamente simpática.
Eu. Quero. Adotar. Um. Gato.
Eu quero adotar um gato com o meu gato imaginário, que ainda não se manifestou em forma física, mas está por aí em algum lugar do mundo e não tem nome de macaco.
Ain, como eu quero adotar um gato e colocar fotos dele no Instagram, vestido de forma casual, ou então com roupa de gala. E o outro, he has beautiful blue eyes, nice pink lips... Greasy hair. Pode até se chamar Jesse, ser inteligente e escrever legendas engraçadas nas fotos do nosso gato hipotético (eu realmente amo essa palavra).

E o nome do gato vai ser Ross.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

E eu te chamo pra almoçar

Já não precisa se iludir ou comemorar adiantado, pois não vai acontecer. As cervejas não vão acontecer, nem as minhas risadas vazias pra quem não conheço. Não me chame pra beber na sarjeta, ouvir uma fileira de carros tocando cada um um ruído diferente que alguns se atrevem a chamar música. Ah, e as novas redes sociais, não me mande convites ou fotos apelativas. Não, não vai ser dessa vez. Não vai ser agora que vai me chamar pra sair pra onde minha alma parece que vai morrer. Quem disse que eu mudei agora que eu me mudei? Que eu fiquei mais dócil ou que minha loba fica bem apertada no meu chakra base? Eu vou caminhar na praça e pisar nas folhas secas pra ouvir aquele barulhinho que me arrepia. Na sarjeta ou bebendo coisa feita de trigo, por Deus, você acha que me encontrou onde? Não me convença de que agora a vida é outra e que a tinta do momento é da cor de Malibu. Eu não sou esse tipo de garota que você arrasta pela mão. A gente ainda combina vinho seco com chocolate meio amargo e a gente canta nobody knows where they might end up, nobody knows enquanto passa rímel. A gente puxa pela mão. E se você acha que almoçar e jantar é uma coisa brega, saiba que vou me lembrar disso antes de te chamar pra fazer isso comigo em Paris. A gente não quer uma vida nova. Uma personalidade louca e descabida. A gente ainda quer os mantras e redes na varanda. Um por do sol em Itapuã e ser feliz e falar de amor. E o amor que a gante faz não deixa de ser o amor só meu, do meu jeitinho de levar a vida e a dança. De te conduzir pela mão... A gente fala de amor e a langerie é da cor que eu quiser. A gente não bebe cerveja. A gente não abaixa a cabeça. A gente não tem medo de dizer não. A gente sai pra almoçar.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Lembro-me que sou amor

Solto-me das amarras e lembro que sou amor.
Livro-me do medo e lembro que sou amor.
Deixo ir tudo que não é meu e
lembro que sou amor.
O resto é Ego, ilusão.
É terreno, material, transitório.
Meu corpo, cabelo, pele,
meus bens, minhas paixões.
Livro-me de tudo que não é meu
e estou transbordando amor.
Não sou meus sentimentos,
meus diplomas ou minhas opiniões sobre o mundo.
Não sou minhas dores nem minhas alegrias.
Eu sou bem maior
e estou do meu lado.
Eu sou minha companhia
e também sou amor.
Livro-me daquilo que penso, sinto e vejo.
Deixo ir tudo que não me faz bem.
Eu só sinto amor.
E então tudo deixa de doer,
qualquer coisa cai por terra,
eu não preciso de nada mais.
Porque eu sou amor.
Eu sou só amor.
Eu sou só amor.

domingo, 4 de dezembro de 2016

Terceiro dia

Choveu a noite toda, o céu está cinza (um cinza lindo) e o vento sopra gelado. Todo o mundo está cinza também, as pessoas choram e algo morreu em cada uma delas.
No terceiro dia, fui acordada com uma foto do meu grande amor juvenil hollywoodiano mordendo a perna de um óculos com seu olhar mais sexy. Aquela lembrança ao mesmo tempo cheia de amor também fez com que tocasse Cindy Lauper na cabeça de todos os que viram. If you're lost, you can look and you will find me, time after time. If you fall I will catch you I'll be waiting, time after time...
O céu chora, os amigos choram, os curiosos se sensilibizam. Eles choram as minhas lágrimas e eu vou me enxendo de amor.
Sabem, o amor não dói. Ainda o defendo com unhas e dentes, sempre o farei. O que dói é a mudança, a saudade, o medo, a confusão, as lembranças. O amor me faz dançar no chuveiro e praticar meditação balinesa. O amor é aquilo que fica, preenche o peito e que emana.
Não precisa chorar, só amar e agradecer...
O que Brás Cubas fez no terceiro dia mesmo? No primeiro dia pensei em me matar. No segundo, em virar padre. No terceiro, em beber até cair. No quarto, pensei em escrever uma carta para Marcela. No quinto, comecei a pensar na Europa e no sexto, comecei a sonhar com as noites em Lisboa. Em seis dias Deus fez o mundo e eu refiz o meu. 

É, Brás, acho que no terceiro dia eu já refiz o meu.


sábado, 3 de dezembro de 2016

Aperte as minhas bochechas

e me chame de Marcelita. Me abrace de novo e me leve pra tomar café na nossa padaria de sempre. De sábado de manhã, rabisque meu caderno durante as aulas e ria quando eu pronunciar os nomes dos Pokemons.
Eu te chamei pra falar dele, como na última vez. Eu te disse como ele era e que era diferente de tudo o que já conheci. Dessa vez você vai ter que me dar outro conselho, baixinha, porque aquele de ficar com raiva dele, aquele conselho já não serve mais.
Vamos nos sentar na calçada e deixar o vento bater no rosto e no cabelo. Segure as minhas mãos pra gente ver o sol se pôr. E o Doritos, Jú? Compre pra gente se embreagar de Doritos enquanto você inventa outro conselho que dê certo.
É como uma tatuagem no coração. Tatuagem, não cicatriz. Quando você passa por algo e aquilo nunca mais sai de você, fica sempre ali, belo como seus olhos.
A gente na rodoviária ou no mercado comprando doces. No cinema tendo aula de Geopolítica. Eu te apresentando o meu melhor amor, minha tatuagem mais bonita. Eterna, assim como você.
Jú, hoje voltei aqui pra te mostrar minha nova tatuagem, três anos depois. Não me peça pra odiar, só aperte as minhas bochechas.
E vamos sorrir. Olhar o céu. Vamos sorrir...

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Amor na barriga

É um amor que percorre a boca do meu estômago e um pouco do esôfago até chegar ao coração. Também acontece quando desço de carro uma rua bem íngreme e cheia de valetas. Você me olha como quem não precisasse de mais nada ou encontrasse um pote de estrelas, o amor me gela e me deixa sem ar. Não sei explicar. É uma sensação gostosa. Uma coisinha, sabe? Uma coisinha. Quando você encosta seu nariz no meu, quando as cócegas são feitas com as pontas dos dedos, tão leves quanto as que você envia por mensagem, daquelas em que eu sofro menos. E quando você me acorda, me deixa dormir no seu peito. Quando vai embora e o cheiro fica. Não dizem que o peito dói quando você não vem? É tipo assim, só que do avesso. Amor. Só que na barriga.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

"Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios"

Rosados molhados macios beijáveis. Eu reparei neles logo que vi, junto com a barba que está meio em alta nos últimos tempos, mas que não cai bem em todo mundo.
Eram os lábios entreabertos mais lindos que já vi.
Seus lindos lábios sujos de cobertura de bolo ou vermelhos de batom. Os seus lábios  todas as vezes em que eu precise ouvir "boa prova" antes de uma prova. Que eles falem baixinho no meu ouvido dentro do cinema, justamente pra que eu pare de falar bem baixinho no seu ouvido no cinema.
E não são foram só braços fortes, pele macia, seu cheiro de amaciante e um ar de quem iria despedaçar meu coração. Foram aqueles lábios tão beijáveis e doces que me disseram "oi" e então eu soube que eu quero te manchar de batom e assoprar na sua orelha pra te acordar aos domingos.
Eu quero que você me diga, com a voz mais sexy que conseguir, que preciso passar no banco pra pagar a fatura do cartão de crédito. Você poderia me dizer que daqui a dez segundos eles ativarão todas as armas nucleares e que a humanidade não passará de cinzas.
Você pode me contar, se quiser, enquanto eu caio do 25° andar - ou das nuvens - e eu serei estarei em paz como uma pena pousando sobre um travesseiro.



Comprometida

Primeiro vamos tratar essa paixão como um narcótico. O corpo entra em transe e você se despluga da realidade, um mundo paralelo onde tudo é possível. Os beijos e o cheiro de fumaça no seu cabelo, irresponsabilidade ilusória, uma grande propenção a tomar atitudes descabidas.
Depois um chá e uma meia. Nunca tome chá sem meias, perde todo o encanto do momento. O resto das roupas é opcional. Um bom livro de comédia romantica ou filosofia, e se não tiver nublado, feche as cortinas.
O quão irresponsável você pode ser um pouco antes dos 30, na véspera do seu casamento, se você resolver se trancar em casa com um chá e dois livros, ouvir uma bossa nova e pensar naquele seu ex colega de trabalho enquanto estuda um belo artigo científico sobre o ciúme. Acho que nem Balzac, nem Freud, nem mesmo a Lili Prata iriam julgar assim... Uma mulher inquieta que está louca, maluca mesmo, por uma boa noitada sozinha e um buquê de rosas vermelhas compradas com seu próprio cartão de débito.
Comprometida...
Comprometida...
Bobagem.

terça-feira, 20 de setembro de 2016

Conto erótico para universitários indefesos

Preparação... Copidesque. Copi, pros íntimos. Orçamento limpo e claro, todo em caixa baixa. O preço varia de caracteres por lauda. Lau-da... Revisão gramatical, ortográfica, tradução... Revisão mínima, 20 linhas. Formatação, normatização, ABNT, recuo de três centímetros... Caixa baixa... Times ou Arial? Fonte 12, espaçamento 1,5, jus-ti-fi-ca-do. Artigos acadêmicos, teses, tcc, mestrado, doutorado, pós doc. Em doc? Em pdf? Impresso? Profissionais do texto. Profissionais... Do texto. Normas da revista, resumos em dois idiomas, trabalhamos com qualquer área acadêmica (Ciência da Informação? Da Computação? Imagem e Som? Dissertação sobre Orgononia?). 1250 caracteres por lauda... Com espaços, com notas de rodapé... Paginação. Revisão bibliográfica. Coesão. Coerência. Estilística. Estilística... Banner pra congressos, eventos, simpósios, editoração, diagramação, redação institucional, veículos impressos e digitais, literários, jargão técnico bem baixinho no meu ouvido, monografias, revisão em língua espanhola, revisão final.

E então, universitário indefeso, uma mulher assim te assusta?

terça-feira, 13 de setembro de 2016

Fernanda

Eu segurei nas mãos aquele par de brincos que comprei pra ela e que nunca entreguei. Fernanda terminou com meu primo e saiu da família, nunca mais a vi, mas os brincos permanecem aqui guardados e eu os uso de vez em quando. A questão aqui é que Fernanda não é somente a mulher que um dia iria até minha casa levar seus belos filhos loiros de nariz fino pra brincar com meus pequenos e quase orientais, Fernanda é quase que um vocábulo no dicionário, um conceito, uma ideologia. Fer-nan-da! Eu desde pequena fui Fernanda nas brincadeiras e nas noitadas - meu nome é Fernanda - e então o cara nunca iria me encontrar no Facebook, era só virar as costas, deixar o meu perfume e partir um coração. Eu passava as mãos pelos meus cabelos de fios longos e grossos e então eu era ela, quase que uma transformação mutante, eu me tornava Fernanda. E então, além de mim mesma e dos brincos pesados e azuis, encontrei várias delas durante esses vinte e poucos anos, todas mereciam o nome que tinham. Nunca encontrei uma só Fernanda que não fosse bela ou que não aparentasse se sentir assim. Por muito tempo esse foi o nome da minha filha, das minhas Barbies. É algo tão mitológico e astrológico, Fernanda poderia ser o nome de Deus, da Chanel, uma música do Chico ou uma personagem de Clarice. É poesia por si só, uma fascinação dessas que você inventa na lua cheia, uma oração, o sabor de um vinho do Porto harmonizado com chocolate amargo. Ela não é ao leite, não é uma mera cerveja barata e que te dá "pancinha" - ugh - eu sou Fernanda toda vez que me olho no espelho e me desejo.

Fer...
Os dentes tocam os lábios e o ar escapa lentamente
Então o dorso da língua toca o céu da boca
E depois a língua toda
Nan...
Boca e nariz e a vogal de leve como um
Gemido
Da...
Decisivo, uma pressão, uma explosão e um alívio
E no final você sorri
Você está sorrindo!

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

O Emplasto

Empoeirado e esquecido num canto qualquer, de uma memória falha qualquer, cheirando à coisa antiga, talvez até nunca usada. O emplasto. Eu o fiz uns anos atrás, numa madrugada de lua cheia, roubei a ideia de Machado e fiz o meu próprio remédio pros dias de melancolia. Bem, se você estiver pensando que esse emplasto foi feito com lágrimas - ou lágrimas de sangue - ou com as gotículas de orvalho de uma noite de setembro, não, não. Entenda, ele foi feito com tudo que há de azul e bom. Foi feito com as pontas dos meus dedos que me fizeram caminhar até aqui, simbolicamente, claro. Perceba como eu sou uma escritora melhor. Ele foi feito com cheiro de perfume misturado à cigarro e àquela vida boêmia e leve que se leva depois da meia noite. Eu lembro que quando o fiz pela primeira vez, ouvi aquela música tocando na minha cabeça enquanto caminhava de delito em delito, beijo em beijo. Eu estou ouvindo a música agora que abri o vidro, você não? Eu sinto o cheiro do sereno, as estrelas acendem uma a uma enquanto você percorre as letras com o olhar. O emplasto é certeiro, você não pode evitar que seu sangue ferva ou que seu coração se aperte no peito. O que você sente? Saudade? Você sente que precisa voltar àquela madrugada e ter de passar frio outra vez, ou que não pode fazer tudo aquilo novamente? O emplasto já foi criado, ainda mais, ele já foi aberto. Ele te cura da melancolia, te envolve em seus braços nus. Ele aquece o seu peito e expulsa aquilo que estava esquecido em você, seus melhores e mais quentes desejos. Você ouve a música, sente o seu toque, pode chorar e pode sorrir, pode se lembrar, pode se tornar uma pessoa da qual sua futura filha se orgulharia. Ele já foi criado, ele está aqui, aberto, esparramado em você. E você pode abri-lo quando quiser, ele sempre estará aqui. Bem aqui.

Tá sentindo?  

domingo, 21 de agosto de 2016

Ela de calcinha escreveu sobre você

Você devia se orgulhar muito quando uma mulher te der um sorrisinho igual ao que ela dá Timberlake ou ao Antonio Prata. E quando ela decidir encher uma taça de vinho pensando em você. Vinho, certo? Cerveja não. E quando uma mulher, descabelada e usando um perfume doce, quando essa mulher resolver escrever sobre você e se ela estiver usando as meias calças favoritas, imaginando tirá-las pra você. Bem, cavalheiro de sorte, isso não é motivo pra alarde, então pode se sentar. Não acredite que seu cabelo é tão sexy assim ou que seus olhos sejam puxados o suficiente. Não precisa pensar achar que é o último exemplar do sexo masculino em um mundo apocalípto. Ela vai continuar preferindo assistir Gilmore Girls e beber refrigerante sem se importar com futuras celulites. A questão, entenda, uma mulher bem resolvida com seus próprios sentimentos, ela sorriu pra você, de um jeito tímido e discreto. Ela sentiu aquela sensação que jurava ser própria das pré-adolescentes, sentiu aquilo de novo. Uau! Ela dançou Like a Virgin de calcinha e camiseta, depois olhou as estrelas na quarta à noite, depois da aula, ouviu Justin Timberlake e pensou em você. Ela escreveu sobre você e agora, agora você é imortal. Um tipo de cara comum, barba e perfumes amadeirados comuns, o qual se tornou parte de um belo texto, feito por uma bela escritora seminua, domingo às 3 da manhã. Um jeito bem sexy e complicado de virar poesia, não é?

sábado, 2 de julho de 2016

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Uau, que casa grande. Que cheiro é esse? Deve ser cerveja, odeio esse cheiro, alguém deve ter derrubado. Tá, ok, tá tudo sob controle, só preciso achar a Ana e... Nossa, que roupa estranha, ela deve estar com calor com essa jaqueta enorme. Não, foca foca. Achar a Ana e depois ir achar ele. Agir naturalmente, sorrir. Lembrar de não tremer.

Nossa, eu preciso sair desse banheiro, a Ana disse que ele já chegou e eu preciso ir ali onde ele tá. Preciso passar perto dele. Deixa eu ver se meu cabelo tá legal. Preciso sorrir e não rir muito, tentar não ficar com vergonha. Droga, nem me lembro a última vez que fiz isso, parece que faz um tempão, até pareço uma adolescente que nunca beijou. Calma, calma. Vamos lá. Um. Dois. Vai.

Ai, cara, me beija logo, já estou ficando desesperada de nervosismo. Ah, ok, deixa eu pensar em qual... Eleições nos Estados Unidos, Obama... Tá. Li sobre isso hoje de manhã.
Hm.. Ele deve ser de Áries, é charmoso. Talvez leonino. Não, Áries. Áries com certeza. Será que eu pergunto? Ele vai me achar muito exotérica. Deixa eu fazer mais cara de sexy. Olhar nos olhos.

Que lugar mais... Convidativo? Um quarto. Ok, não vou entregar tudo de bandeija hoje não. Com certeza não. Respira... Preciso me acalmar. Deixou a porta aberta, interessante, romântico. Gostei desse quarto, me lembra aquele de As vantagens de ser invisível. Luzes de natal... Romântico.

Talvez eu devesse puxar esse lençol por cima da gente, tem muitas pessoas passando por aqui e... Talvez eu devesse. Um. Dois. Dois e meio. Dois e setenta e cinco. Vai.. Isso. Ótima ideia, ótima ideia.
Ele deve ter um tic tac na boca. Que barba macia, acho que vou... Uau! Uau! Mão no cabelo dele. Que lábios macios.. Acho que estou sentindo frio na barriga, meu deus! Uau, como ele beija bem. Acho que eu devia.. Eu devia beijar mais de vagar, sem pressa. Ele tem olhos lindos, mas deixa eu fechar os meus. Cabelos, pescoço... Nariz. Lábios. Morder, ok. Certo. Estou indo muito bem. Só vou dar mais uma olhadinha rápida.
Ele realmente é muito bonito, ainda bem que eu saí daquele banheiro. O cheiro dele me agrada, estamos debaixo dos lençois que eu puxei. Ele está me alisando, eu estou em uma cena de filme.. Está tudo muito calmo, romântico.. Mas eu sinto frio na barriga e eu sinto em outros lugares também. Uau, como ele é lindo. Mesmo assim de perto. Cílios lindos e pele linda. Olhos de pupilas líquidas, rasgadinhos, gosto de tic tac, uma roupa com cheiro de amaciante, o cabelo macio. Eu acho que eu devia começar de novo. A beijá-lo. Vou começar, mais uma vez..


sábado, 4 de junho de 2016

Not your friend

Olha, a gente não precisa mesmo fazer isso, entende? Não precisa me perguntar se estou bem e eu não preciso fingir que me importo. Não me leve a mal, o problema não é você. Sei que parece um clichê de comédia romântica, mas eu juro que é verdade. Eu nem deveria estar me explicando, mas isso também não é problema seu. Estou fazendo isso por mim. Bem, o meu limite é bem pequeno, bem pequeno mesmo. Vamos tentar entendê-lo como o limite de um abraço. Sabe que meus amigos podem me abraçar, eu pareço ser bem fofa, eu abraço minhas amigas quando estou afim. Mas você, você... Não sei nem seu sobrenome. Eu não quero que você rele em mim, que puxe conversa, que beije a minha mão e que faça qualquer comentário sobre minha roupa curta. E eu vou passar por você sem cumprimentar, eu fiz isso hoje mas você não viu. Eu desci do meu carro com o peito em chamas, eu atravessei o mercado em dois minutos, correndo, desviando dos senhores lentos escolhendo a marca do amaciante. Eu estava com os punhos cerrados, eu estava de peito aperto, mas olhando pra baixo e então eu te vi. E sabe o que eu fiz? Eu apertei mais os punhos e eu andei mais rápido. Você não é meu amigo, ok? Eu não preciso te falar oi, só por respeito, sabe? Só se eu esbarrar em você. É o que eu faço com todo mundo, eu falo oi pra quem eu não gosto. Não é que eu não goste de você, mas é muito desconfortável quando tiram você da sua zona de conforto. Hoje eu tinha planejado ficar em casa sozinha, vendo uns vinte e cinco episódios da minha série preferida, chorar um pouco só pra não perder a oportunidade, ficar enrolada no cobertor porque está bem frio aqui. Mas eu tive que sair de casa e eu não gostei do que eu vi. Eu tive que me manter de cabeça baixa e punhos cerrados. Eu vou mudar tudo isso depois deu um banho quente e um bom vinho, eu vou superar tudo, vai passar e ficar bem. Só que com você eu não quero ter de me preocupar, pra você eu não vou abaixar a cabeça, não vou hesitar. Então se você puder entender, se você me ajudar. Se ficar bem longe e se comportar como um completo desconhecido que é, então talvez você saia do meu caminho e me deixe sozinha com meus ploblemas. Se você me deixar em paz, então vou ter mais tempo pra poder me curar, levantar a cabeça pra quem realmente importa, pra que já ultrapassou esse limite, sabe? O limite do abraço. Pra quem já chegou onde eu realmente estou frágil, de peito aberto, de coração na mesa.
Então saia, saia da minha frente.

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Ela fica tão linda quando está com raiva

Você gostaria de beijá-la em cima da mesa de sinuca. O que estaria fazendo aqui uma moça como ela, nesse lugar cheio de bêbados suados? Exeto eu, claro. Você iria pensar em beijá-la se a visse por aqui, aposto que os outros estão pensando nisso também. É que ela parece um bibelô, suas feições não condizem com esse lugar. Exeto quando ela começa a jogar sinuca com o Mané e o Dito. Ela se inclina o suficiente pra que você possa ver uma tatuagem em seu quadril. Uma rosa, não parece ser uma tatuagem recente, talvez tenha feito há uns seis ou oito meses. Ela está arrebentando, dando um trabalhão danado pros caras, mas não me atrevo a chegar perto. A questão é que eu a beijaria em cima da mesa de sinuca. Eu a convidaria pra tomar um vinho, mas na minha mente ela diria que prefere cerveja. Tem os cabelos enrolados, pintados de vermelho desbotado, um perfume noturno, uma gargantilha dourada. Então eu a beijo no pescoço e nos ombros. Ela passa uma perna por cima da minha cintura, ela está quente e ruboriza de calor. Acredite se quiser, você se ajoelharia e imploraria pra levá-la pra casa. Ela não dirá seu nome. Mas o seu olhar vai bater nos olhos dela e voltar pra você, assim como qualquer ódio que alguma mulher veio a sentir por ela. Ela te olha com certo desdém, você poderia achar, mas o real motivo é que ela não precisa, nem por um segundo, de qualquer uma das suas desprezíveis opiniões.
Estamos só nós cinco. O dono do lugar, Mané, Dito, a bela moça e eu. Ela se aproxima do balcão que eu estou, pra pagar a conta. Ela está bem próxima agora, há dois ou três passos-de-salto-agulha-vermelho. E então ela vai embora, passando por mim como se eu nem estivesse ali, já tem dois anos e duas semanas, desde que ela me mandou arrumar as malas e sair de casa.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Carta ao Universo

É manhã. Nove da manhã de um domingo de outono, um pouco frio, as cortinas balançam. Uma brisa sopra o lençol branco que cheira à lavanda, uma fresta de luz o incomoda e o faz acordar. Temos um gato, quem diria. O gato se chama Gato porque foi a referência mais fácil de lembrar quando o adotamos. O gato sobe na cama, ele espirra, reclama por termos um gato, mas logo a raiva passa. Eu estou com os cabelos molhados porque levantei mais cedo pra tomar um banho, logo temos que nos arrumar pra írmos na chácara. Ele tem os mesmos olhos de quando nos conhecemos e quase não engordou. Ele usa roupas alternativas e ainda gosta de rock. Às vezes a gente gosta de acender umas velas e conversar dentro da banheira, e ele me traz flores em dias comuns. Estou grávida. É um menino. Minha barriga ainda não aparece tanto, mas ele diz que vai ensiná-lo a andar de bicicleta. Ele abre os olhos e eu estou do seu lado ouvindo sua respiração. Ele diz que me ama, que sou a mulher da sua vida, que estou ficando com a bunda maior e que ele vai ser um ótimo pai. Ele diz que vai descer lá em baixo pra falar com o porteiro, coisas burocráticas. Ele desce a mão pelo meu ombro, estou de camisola de seda, ele me beija a nuca e vai pra cozinha tomar café. Eu tiro o gato que agora está na cômoda, me olho no espelho e vejo que minha bunda está realmente grande. Meus cabelos são castanhos e estão longos. Eu tenho um diploma de doutorado pendurado na parede e minha casa é pequena, mas limpinha e organizada. Ele não arrumou a cama de novo. Eu reclamei disso ontem, meu Deus. Mas ele bateu a porta do quarto arrastando os chinelos, consegue ouvir? Eu consigo. E me sento na cama e sinto o cheiro dele, olhe só. E preste atenção naquela caixa bem ali no canto, foi um dinossauro de brinquedo que ele comprou pela internet pro nosso bebê. Você consegue ver? É tão paupável. É sim, isso está bem aqui, está acontecendo, eu já ouço a porta bater.